quarta-feira, 30 de setembro de 2009

Litispendência: verificação necessária

A litispendência está conceituada no § 3º do artigo 301 do Código de Processo Civil, verificando-se a sua ocorrência quando nos deparamos com duas ações com identidade de partes, pedido e causa de pedir.Sempre que estiver caracterizada a litispendência, a segunda ação deve ser extinta, sem julgamento de mérito, por tratar-se, assim como a coisa julgada, de exceção processual peremptória, que não admite qualquer sanação.Contudo, devemos frisar que só a citação válida induz litispendência, de modo que, como lembra Voltaire de Lima Moraes, para caracterização desse instituto no segundo processo, onde haveria a repetição de ação que está em curso, é preciso que no anterior tenha sido feita a citação, pois do contrário ela não terá ocorrido.Devemos concluir, destarte, que para haver litispendência são necessários dois elementos: a identidade de ações (iguais partes, pedido e causa de pedir) e a citação válida nas duas demandas.Pois é justamente o primeiro elemento para a verificação do instituto em exame que pode suscitar alguma dúvida em relação às demandas coletivas.Como visto anteriormente, os parágrafos 1º e 2º do art. 103 do Código de Defesa do Consumidor permitem que os integrantes da coletividade, do grupo, categoria ou classe ingressem com ações individuais, a despeito de estar em trâmite uma ação coletiva.Desse modo, concluiríamos que o réu na ação coletiva, o qual também figura como requerido na demanda individual poderia alegar, preliminarmente em sua contestação, a ocorrência de duas ações idênticas, requerendo a extinção sem julgamento do mérito de uma delas.Todavia, tal possibilidade tornaria despicienda quase todas as peculiaridades da coisa julgada no processo coletivo, principalmente os princípios da coisa julgada in utilibus e secundum eventum litis.No intuito de evitar tal ocorrência, portanto, os autores do Código de Defesa do Consumidor inseriram o artigo 104, esclarecendo que as ações coletivas não induzem litispendência para as ações individuais.Antes de adentrarmos na análise do referido artigo, devemos esclarecer que houve um equívoco do legislador ao afirmar que não induzem litispendência para as ações individuais as demandas coletivas previstas nos incisos I e II do parágrafo único do artigo 81. Na verdade, não há razões para que os processos que versem sobre direitos individuais homogêneos também não estejam abarcados pela norma do artigo 104.Assim, onde se lê "previstas nos incs. I e II do parágrafo único do art. 81", leia-se "previstas nos incs. I, II e III do parágrafo único do art. 81".De outra banda, também devemos entender por equivocada a segunda remissão prevista no artigo 104, porquanto o dispositivo, quando menciona os efeitos da coisa julgada, refere-se tão-somente aos incisos II e II do artigo 103 do CDC. Na verdade, o inciso I deveria também estar aí incluído.Desse modo, comungamos da opinião de Ada Pellegrini Grinover, quando afirma que a referência do dispositivo aos "efeitos da coisa julgada erga omnes ou ultra partes a que aludem os incs. II e III do artigo anterior" deve ser corrigida como sendo à coisa julgada "a que aludem os incs. I, II e III do artigo anterior".Esclarecidos os equívocos do legislador na redação do artigo 104, passemos à análise do conteúdo desse dispositivo e verificamos que não ocorre litispendência entre uma ação coletiva e uma individual porque, como nos esclarece Ada Pellegrini Grinover, o pedido dos processos é inquestionavelmente diverso. Segundo a autora, enquanto as ações coletivas visam a reparação ao bem indivisivelmente considerado ou a obrigação de fazer ou não fazer, as ações individuais tendem ao ressarcimento pessoal.Ademais, não haverá identidade de partes, pois em uma demanda individual será parte apenas quem teve seu direito violado em sua esfera jurídica individual, ao contrário da ação coletiva, em que todos os lesados figuram no pólo ativo, não obstante substituídos no processo pelos entes legitimados para a propositura da ação.Porém, se comprovada a exclusão da possibilidade de litispendência entre demandas coletivas e individuais, o mesmo não podemos afirmar entre duas ações coletivas, já que é possível haver duas ações coletivas com as mesmas partes, pedido e causa de pedir.Contudo, para que o afirmado acima ocorra, é mister tratarem-se da mesma espécie de interesses, ou seja, deve haver duas ações defendendo o mesmo direito individual homogêneo, difuso ou coletivo strictu sensu. Caso contrário, não haverá litispendência, embora possa se constatar a necessidade de conexão dos processos, como adverte Antônio Gidi. Por fim, o artigo 104 refere-se à suspensão do processo individual em até 30 dias após a constatação do ajuizamento da ação coletiva, a fim de que as eficácias (o artigo 104 refere-se a "efeitos’) da coisa julgada beneficiem os autores das demandas coletivas.Logo, se o autor individual tomar ciência do ajuizamento de uma ação coletiva, pela regra insculpida no artigo em análise, terá o mesmo duas opções: prosseguir em sua demanda, abdicando da extensão subjetiva da sentença que vier a ser proferida no processo coletivo, ou requerer a suspensão de sua ação individual.Nesse último caso, o demandante individual, se não for favorecido com o resultado da sentença coletiva (improcedente), poderá retomar seu processo individual, em nome dos princípios da coisa julgada in utilibus e secundum eventum litis.Mas, é necessário frisarmos que no caso no parágrafo 2º do artigo 103, se o autor individual habilitar-se como litisconsorte, a coisa julgada formar-se-á para ele e, assim, não será permitido ao mesmo prosseguir com sua demanda individual

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